quinta-feira, 14 de maio de 2009

Preço justo

O sonho da casa própria seria adiado por um tempinho, avisou Joilson à conformada esposa Maricota. Por ora o dinheiro guardado ao longo de toda uma vida seria empregado num projeto mais ambicioso: a construção de um pedágio na estradinha, bem em frente ao terreno do casal. Tudo foi muito bem arquitetado. Joilson convocou uma empreitada entre seus compadres, pagando o mínimo e mais a cachaça. Usando cones e sinalização, o fluxo de veículos foi desviado para o acostamento sem despertar a suspeita da polícia rodoviária. Em três meses o pedágio de três cabines estava concluído. Inclusive com cancela, sensor, máquina de impressão de recibos e todos os acessórios que um primo tranbiqueiro da capital conseguiu sei lá como. Maricota, seu irmão e uma prima ocupariam as três cabines enquanto Joilson organizaria toda a parte financeira. Logo no dia seguinte o pedágio começou a operar de vento em popa. Maricota nunca tinha visto tanto dinheiro na sua vida. Em pouco tempo o lucro daquilo daria para construir não uma casa, mas uma vila inteira. Os motoristas passavam reclamando dos buracos no asfalto, sem entender como o dinheiro arrecadado não remediava a situação. Depois de alguns meses, Maricota já podia enxergar de dentro da cabine os frutos de negócio tão lucrativo: sua casa já estava sendo erguida no terreno que margeava a estrada. Joilson já era o homem mais rico do povoado, que nunca vira ascensão tão rápida em dois séculos de existência. Mas os motoristas começaram a olhar para os cobradores com desconfiança. Os mais cabreiros perguntavam se o valor do pedágio, quatro reais, estava mesmo certo. Onde há fumaça há fogo, e num belo dia o projeto deu água. Umas vinte viaturas baixaram de uma só vez no pedágio, rendendo Maricota, o irmão e a prima, e pegando Joilson de surpresa instalando a cancela do Sem Parar. Algemado mas sereno, Joilson ainda teve presença de espírito para tentar saber como fora pego. Ele perguntou isso ao investigador, que seca e prontamente respondeu "o preço do pedágio". Não era possível que tivesse cometido essa gafe. Ele que se precavera tanto encomendando uma pesquisa de mercado em estradas de norte a sul do Brasil. Mas quando a viatura passou por um pedágio de verdade e Joilson viu a tabela de preços ao lado da cabine, surpresa. Perto dos cinquenta reais cobrados pela concessionária da estrada, sua tarifa era uma ninharia. Estava congelada desde a inauguração e não acompanhou a inflação nem a ganância dos governantes. E como de muita esmola o pobre desconfia, deu no que deu. Mas você pensa que o pedágio do Joilson foi desativado e demolido? Que nada. A concessionária passou a explorá-lo normalmente. Só toma o cuidado de não levantar suspeitas cobrando um preço justo: os mesmos cinquenta reais praticados por qualquer pedágio oficial.

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