quinta-feira, 30 de abril de 2009

Amor à distância

Heitor adicionara Juliana, que conheceu na balada da noite passada, mas só teve tempo de anotar seu MSN. Ela estava online, oba, pensou ele. Logo mandou um "oi" e ela devolveu um "de onde te conheço?". Explicação dada, ela lembrou do gato. E que gato. Resolveu dar trela. Papo vai, papo vem, mouse pra cima, mouse pra baixo, troca de fotos sensuais, o clima esquentou. A sacanagem rolava solta entre palavrões e baixarias abreviadas. A certa altura, ele até passou um paninho para desembaçar a tela. Já não se aguentando na cadeira, marcaram um encontro dali a meia hora. Estação de metrô pertinho, lado direito do trem. Quem chegar primeiro, espera pelo menos 15 minutos. Ele, de bermuda azul e camiseta vermelha. Ela, de blusinha e minissaia. Tudo lindo. Chegaram ao mesmo tempo, saltando de vagões diferentes.
Se avistaram de longe, foram se aproximando, o sorriso se abrindo a cada passo. Agora, frente a frente, confirmavam a boa impressão da noite passada. Perfeito. Era juntarem os corpos para o malho começar. Mas um, dois, três minutos se passaram e nada. Looping. Travou. Deu pau. Quer dizer, não deu. Até que um luminoso aparece sobre a cabeça dela: "Away". O mesmo "Away" que começa a piscar na dele. De "Away" para o inevitável e triste "Offline".

terça-feira, 28 de abril de 2009

Novidades à venda

O produto chegou às ruas sem nenhuma propaganda e de fato não precisava. Porque logo que as vending machines foram instaladas, formaram-se filas imensas. Também, quem é que não precisa de uma novidade, de vez em sempre? Por um mísero real era possível preencher o vazio existencial de um domingo inteiro, passando por cima daquela depressãozinha básica da musiquinha do Fantástico. E tinha novidade para todos os gostos. Desde um novo emprego, passando por uma nova namorada, um bilhete premiado de loteria, o que se pudesse imaginar.
O único porém era sua durabilidade, pois sabe-se que novidade é que nem Chips, impossível consumir uma só. Seu consumo desenfreado tornou o produto cada vez mais perecível. O namorado novo passou a "ex" num instantinho. O bilhete de loteria premiado em minutos virou briga de família. A demanda por novas novidades travou o departamento criativo da empresa, que não tinha mais de ontem tirar lançamentos para abastecer as vending machines. Claro que os consumidores se revoltaram e uma onda de vandalismo botou abaixo todas as máquinas instaladas. As moedas foram saqueadas, impedindo o pagamento de credores. Os criativos foram dispensados sem indenização. Um estoque imenso de novidades apodreceu nos depósitos. O lado positivo dessa história é que houve uma super-valorização da boa e velha novidade. A gravidez da filha da vizinha virou assunto nacional. A aprovação do Júnior em Medicina foi matéria de capa. Até capítulo de novela ficou inédito. A velha novidade estava na moda de novo. Retrô, mas na moda.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ambiguidades

Querer ou não quer, eis a questão. Até onde a gente quer ou não? Sucesso, amor, paz? Desejo ou necessidade? A vida é curta, dizem. A gente só se arrepende do que não faz, enfatizam. Acabei de ler um trecho do livro do Lowen. Mais ou menos, ele diz que mudança gera tensão, desequilíbrio, desgaste. E como é sabido, tendemos a mesmice. Daí a dificuldade de sair do lugar, daí talvez a gente se pergunte tanto se de fato queremos. E o querer é racionalizado, se descola do desejo. Só se justifica enquanto necessidade. Mas de quantos supérfluos não é feita a vida? Abra seu armário e a sua estante. Quanta coisa acumulada de que você não precisa. Quantos desejos satisfeitos justificados como necessidades de ocasião. Se a vida é feita de momentos, e se os desejos são necessidades momentâneas, então a vida é feitas de desejos, ok? Parece um sofisma. Mas é assim que me justifico. Quero porque quero porque quero agora. Amanhã provavelmente não saberei porque quis.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Erradinho

Sai daí, menino, tá sujando o sofá. Eu já não falei pra não fazer isso? Quantas vezes eu preciso repetir que não pode? Acordado até essa hora? Mastiga de boca fechada! Isso é hora de voltar pra casa? Se não estudar não vai ser ninguém na vida! De quem é essa cueca jogada? Essa sua namorada é uma piranha! Cala a boca que eu tô vendo tv! Esse seu tênis tá um lixo! Por que você não me ligou? Você tá errado e você sabe disso! Tá na hora de perder essa barriguinha, hein? Nada de futebol, hoje a gente vai almoçar na mamãe! Quer parar de roncar? O Junior também é seu filho! A gente precisa conversar! Bonito, hein? Agora eu é que sou a chata! Nunca podia esperar isso de você! Eu não te reconheço mais! Fala com meu advogado! Nossa, você continua o mesmo! Vai passar o dia inteiro em casa? Já fez sua caminhada diária? Devagar senão você escorrega! Já tomou seus remédios? Você sempre faz o contrário do que o médico manda. Quem mandou levar uma vida desregrada? Vê se agora descansa em paz!

terça-feira, 21 de abril de 2009

Obra do acaso

Ontem estava contando a amigos um relato que li a respeito da gravação de "Caçadores da Arca Perdida", um dos meus filmes prediletos. Na gravação da sequência mais cara do filme, que seria rodada se não me engano no Cairo e com milhares de figurantes, o diretor Spielberg se dá conta do atraso do astro Harrisson Ford. Ao se informar do paradeiro do ator, fica sabendo que este amanhecera impossibilitado de trabalhar devido a uma forte gripe. Aflição no set, já que todo cenário estava armado para rodar a sequencia épica de luta de Indiana Jones contra os árabes. Quando tudo apontava para atraso, estouro de orçamento e produtores no encalço do diretor, eis que o gênio de Spielberg, num estalo providencial, fez a diferença. Chamou membros da equipe e propôs trocar a sequencia de luta por um único duelo entre Indiana e um árabe. Depois de uma ameaçadora demonstração de destreza com a espada por parte do árabe, o herói resolveria o embate com uma atitude anti-heróica: sacando tranquilamente seu revólver e desferindo um tiro mortal. Sob gargalhadas de aprovação, o diretor ligou para o agente do ator e propôs ao astro que viesse ao set e permancesse por 15 minutos para a gravação de uma única cena. Harrisson concordou e protagonizou a cena mais memorável do filme e das mais lembradas da história do cinema. Obra do acaso? Nem tanto. Dizem que a sorte encontra os mais preparados. Nesse caso o imprevisto se transfigurou em sorte quando encontrou um gênio.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Sobre medo do futuro e destino

Outro dia estava na mesa de um bar acompanhado de duas amigas que discorriam sobre o irresistível tema da previsão do futuro. As duas haviam consultado a mesma vidente e comparavam as impressões que a mulher lhes tinha deixado. Estavam convencidas dos dons advinhatórios da taróloga, não só pelo seu “índice de acerto“, mas porque esse bom índice havia se repetido em mais meia dúzia de consultas de amigas. Este preâmbulo não pretende abrir uma discussão sobre o charlatanismo, posto que não tive a oportunidade de consultar essa profissional e tirar minhas próprias conclusões. Estou mais interessado é na ansiedade que o futuro desperta em nós e, em contrapartida, o quanto “saber“ esse futuro nos conforta - e nos conforma. Sem dúvida a incerteza sobre o futuro e a certeza sobre nossa própria morte são ingredientes suficientes para nos tirar o sono de vez em quando. Porque já que a morte é certa, enquanto vivermos queremos fazê-lo da forma mais plena possível. Só que nada garante que conseguiremos, pois não sabemos ao menos o que o dia de amanhã nos reserva. Por isso é tão reconfortante ouvir das palavras de um especialista que o nosso destino está selado. Que não é preciso lutar por coisas boas que certamente virão. Nem dar murro em ponta de faca sobre coisas ruins que vão acontecer mesmo. Mas “saber tudo com antecedência" é mesmo reconfortante? Não acredito. Penso que a graça de viver ainda está em não saber. Em acreditar no livre arbítrio, na sua própria capacidade de mudar as suas coisas e fazer do empenho na mudança o seu processo de crescimento. Viver por tentativa e erro pode dar mais nervoso, mas aí é que está a graça da coisa. Os acertos são bem mais comemorados. E os erros, com o tempo se tornam mais toleráveis. É a oportunidade de fazer do seu jeito, sem que alguém diga como e quando a vida deve acontecer. Porque aí também pode residir o problema de atribuir a outro a responsabilidade pela sua vida: deixar que as coisas aconteçam ou fazer acontecer de um modo que você nem escolheu.

domingo, 19 de abril de 2009

Filmes policiais

Acabo de ver “Os donos da rua", um policial ruinzinho estrelado por Keanu Reeves e Forester Whitaker. Não gosto de ver filmes na tv, para mim filmes são necessidades de momento e assim, o cinema e a locadora são mais democráticos do que a imposição da grade. Mas para preencher o final de tarde modorrento desse domingo, o policial parecia bastar. Como eu esperava, foi uma sucessão de clichês hollywoodianos. O mocinho, o investigador representado por Keanu, é um matador impulsivo que gera ciúme entre seus colegas pelo seu ótimo desempenho dentro da corporação. Daí é envolvido na morte de um policial e começa a desconfiar de acontecimentos estranhos, até chegar a um caso de corrupção na polícia. Óbvio que no final, o mocinho e os bons valores triunfam. Porque mais do que a necessidade dos estúdio de faturar, o enredo do filme reflete a nossa necessidade de redenção e de se fazer justiça. Além da projeção no herói, essa figura mítica que vive dentro de cada um. Sem contar que nesse caso a arte não imita a vida, então os finais redentores servem como esperança de tempos melhores, com menos corrupção e mais segurança. Ou seja, o cinema se presta ao papel de literalmente iludir, nos fazendo acreditar que nosso modelo de sociedade ainda é viável. O que não chega a ser nocivo, pois sabemos se tratar de entretenimento. Menos mal do que perder duas horas na frente de uma tela sem testemunhar um único vislumbre de refinamento criativo.

Feriado em São Paulo

As vésperas de um feriado em São Paulo, vem a cabeça medidas para tornar esses dias úteis e agradáveis. Por exemplo, garantir companhia. Quero saber quem vai ficar por aqui e que pode dividir comigo uma mesa de bar ou restaurante para contemplar a vida enfim passar devagar por essas ruas, ainda que por poucos dias. Mas se nas ruas o ritmo diminui e a cidade parece outra, entre paredes ela continua cheia e agitada. Porque é a oportunidade dos paulistanos de chegar mais rápido aos seus lugares preferidos e ocupar mesas e espaços com menos concorrência. O que nem sempre acontece, já que muitos ermitões se animam a colocar o pé na rua agora que têm a cidade só para eles. Enfim, no feriado a cidade não perde essa vocação indoor, de vida noturna, de decoração de interiores. Nesses dias em que o melhor de São Paulo se apresenta tão acessível, natural que os filhos do trânsito queiram se esbaldar de mesas de bar, assentos de cinema, passeios em parques, visitas a feirinhas. Somando a isso a oportunidade rara de acordar tarde por alguns dias, o lado utilitário do feriado, a de resolver problemas que o dia-a-dia empurrou pra frente, fica relegado. Mas ninguém se incomoda. Nada substitui o prazer de encontrar os conhecidos bares afora e abrir aquele sorriso como se dissesse “Ah, você também ficou, seu safado? E eu que tava morrendo de inveja de você na praia..."

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Difícil começo

Hesitei bastante para começar a escrever este blog. O que aparentemente não faz sentido porque, por enquanto, só eu leio meus textos. Ou faz todo sentido, quando sua auto-crítica torna-se sua pior inimiga. Uma inimiga a ser derrotada bem aos pouquinhos, com doses homeopáticas de auto-confiança. Como vou adquirí-la, não me perguntem. Espero que meus dedos não me obedeçam, que ganhem vida própria e desandem a metralhar o teclado sem dó, para ver aonde vai dar.