domingo, 7 de junho de 2009

Talento e/ou vocação

Antigamente achava que talento e vocação eram a mesma coisa. Depois entendi que eram dois conceitos diferentes, que poderiam coexistir ou não. Basicamente, talento é uma qualidade decorrente da vontade de Deus e vocação, da vontade do indivíduo. Uma coisa é nata e a outra, inata. Talento é dádiva, a facilidade inexplicável com que alguém nasceu para fazer algo. É o que, por exemplo, diferencia os muito, muito bons, dos excepcionais. Já a vocação é o gosto genuíno por alguma atividade. O fazer pelo prazer de fazer, em qualquer nível.

A combinação das duas características é a mistura explosiva que constrói os grandes campeões. Por isso eles procuram manter as duas qualidades de mãos dadas , pelo menos nos pontos altos de sua carreira. Porque sabem que a vocação potencializa o talento. Até aí, chovi no molhado.

Mas se é fácil entender a diferença conceitual entre talento e vocação, é engraçado como na prática isso ainda se confunde. Muita gente - eu inclusive, confesso- ainda não sabe lidar bem com sua próprias vocações e talentos. Em parte isso é culpa da sociedade, que exalta o talento e despreza a vocação. A mídia adora os palcos, mas pouca atenção dá aos bastidores. Uma vez os basqueteiros Oscar e Hortência afirmaram que ficavam em quadra após o término do treino, praticando uma dose extra de 500, 600 arremessos de longa distância. Um caso evidente de vocação que lapidava ainda mais o talento natural. Só que falar e mostrar cenas do cotidiano batalhador desses deuses os humaniza, e não é isso que a mídia quer.

O que dá audiência é o palco, o título, o troféu. É mostrar o sucesso como se fosse instantâneo e mágico. Até porque os registros do tempo de anonimato são poucos - a imprensa não estava lá para fotografar e filmar. E mesmo quando relata os primórdios da carreira de alguém, a mídia o faz em tom fabulesco de história de cinderela. Ninguém assiste ao filme, cheio de sacrifícios e abnegações, que passa na cabeça do campeão quando ele levanta a tão desejada taça. Desmerecemos o esforço dos campeões, atribuindo os êxitos a Deus.

Não estou dizendo que qualquer varapau, se bem treinado, tenha potencial para ser um Oscar. Mas, como alguém já disse, todos nós temos algum talento. Ou até mais de um. E desmitificar o sucesso ajuda a arregaçar as mangas, pegar esse talento e fazer alguma coisa boa com ele.

A partir daí, convém dar mais ênfase a vocação do que ao talento. É preciso gostar mais dos dias de treino - todo dia - do que dos dias de palco - raros, muito raros. Isso me faz lembrar de uma historinha bobinha sobre três irmãs que procuravam bons partidos, Glória, Vitória e Constância. Nem todo mundo que foi atrás da Glória e da Vitória conseguiu ficar com elas. Mas quem preferiu a Constância, acabou ficando com as três.

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