O Amanhã encontrou o Hoje todo preguiçoso e foi tirar satisfação com ele.
- Escuta, Hoje, eu não aguento mais fazer as coisas que você não resolve. Não vê que eu estou sobrecarregado?
- A culpa não é minha, Amanhã. São as pessoas que tiram minhas tarefas e as passam para você. Apesar do ditado "Não deixe para amanhã...
- Eu sei, eu sei, mas a culpa também é sua. Por que você nunca se mostra mais disponível?
- Eu lá tenho culpa se as pessoas estão sempre ocupadas com o Urgente e se esquecem do Importante? Elas que deveriam ser mais seletivas.
- Mas é você, Hoje, que deveria passar mais tempo com o Importante do que com Urgente.
- É que o Urgente é mais prático, ele sempre diz o que eu tenho que fazer. Pagar contas, resolver o trabalho, malhar, comer. Já o Importante me exige mais, nunca vem com respostas prontas, sabe?
- Ô se sei. É o Importante que me sobrecarrega com tantas tarefas. Para mim ficam os amigos por reencontrar, a reviravolta profissional, os sonhos, as palavras não ditas ao ser amado, a gratidão aos pais, uma infinidade de tarefas adiadas.
- É muita coisa, né? Como diria aquele filme do 007, o Amanhã não é o bastante.
- Não seria "O Mundo não é o bastante"? Deixa pra lá, mas voltando ao meu problema, não tem como você passar mais tempo com o Importante?
- Está difícil, sabe? As pessoas andam histéricas, movidas pelo ponteiro do relógio. Elas estão vendendo o horário do almoço para comprar o horário do jantar.
- Eu sei, andam muito preocupadas com performance, sucesso. Tadinhas, algumas se esquecem até de comer.
- Eu até preferia ficar mais com o Prazer do que com o Urgente. O Prazer é divertido, me deixa letárgico, com ele até esqueço de você, Amanhã.
- Pois é, vê se me esquece. Faz de conta que o Amanhã não existe. Aliás, eu pertenço mesmo ao mundo do faz de conta.
- O problema é convencer as pessoas disso. Elas sempre contam com você, Amanhã. Por isso o primeiro passo não é dado, as palavras ficam presas na garganta, as passagens são sempre remarcadas.
- Nossa, Hoje, como você está poético.
- Eu sou poético. A expressão Carpe Diem foi inspirada em mim. Mas voltando ao seu problema, eu só vejo uma solução.
- Qual?
- A gente tem que matar a Esperança.
- Ma-mas, você testá me propondo um assassinato?
- Sim, a Esperança é traiçoeira. Ela dá ânimo as pessoas, deixa elas acreditarem que um dia poderão ser ou fazer aquilo que desejam, só que isso é balela, conversa para boi dormir. Mas no fundo a Esperança só serve ao conformismo, a igreja, ao governo, aos times de futebol. Apesar de dar conforto aos necessitados.
- Bom, então ela é do bem, não podemos matá-la. Não podemos matar o Comodismo e a Preguiça, por exemplo?
- Esses dão mais trabalho de matar e não resolvem nosso problema.
- Ok, então, matemos a Esperança. Aliás, não é ela que está passando ali.
- Sim, vou chamá-la. Psiu, Esperança, vem aqui.
- Oi, Hoje, oi, Amanhã. Vocês me chamaram?
- Ã-hã, tenho uma supresa para você.
Hoje e Amanhã agarraram Esperança pelo pescoço, que para variar, resistiu firmemente e não sucumbiu. Até que soaram as doze badaladas, o Hoje virou Amanhã, o Amanhã virou Hoje, e ambos se esqueceram do que faziam com as garras fincadas no pescoço da Esperança. Soltaram-na e Esperança pôde fugir para um lugar inalcançável. Provando que ela, a Esperança, é mesmo a última que morre.
domingo, 26 de julho de 2009
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