sábado, 5 de fevereiro de 2011
O mendigo do túnel
Toda noite, na minha volta para casa, passo pelo túnel Noite Ilustrada.
Ou melhor, passo pela casa do mendigo da curva.
Ele está sempre lá, deitado na estreita calçada que contorna o túnel.
Se a calçada já não é confortável para pedestres, imagine para o mendigo, que deita de lado, meio curvado e virado para a parede, com a cabeça quase sempre oculta entre panos imundos.
Passam-se os dias e como sempre o mendigo ali repousando, a impressão que me dá é de que ele nunca sai daquela posição simbiótica com o concreto frio.
Decerto aquele pedaço é apenas seu quarto, pois durante o dia deve sair para garantir seu sustento como pedinte, provavelmente não muito longe dali.
Não escrevo essas parcas linhas para me compadecer do mendigo nem culpar o status quo pelo seu infortúnio.
Meu índice de contribuição filantrópica anda quase a zero e por ora só tenho ajudado minha família, minha faxineira e os empregados do prédio.
É que sempre que vejo alguém que está apenas sobrevivendo, isso me faz indagar o que levou o indivíduo àquela situação.
E fico me perguntando se a pessoa simplesmente não pode ou não quer reagir à sua condição sub-humana.
Porque me faz lembrar de quantos mendigos espirituais andam vagando por aí como se a vida fosse uma sentença a cumprir e não uma dádiva.
Às vezes quero parar, conversar, tentar descobrir onde e quando o elo foi perdido, essa desconexão entre a rotina e os sonhos que nos alimentam pela vida.
Porque não consigo entender minha batalha como algo à parte dos planos, sonhos, esperanças.
Por isso, quando vejo os mendigos, tantos os do tipo sem-teto quanto os sem-sonho, dou graças a Deus que ainda aspiro.
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