sábado, 25 de junho de 2011

Finitude


Não sei se por conta de morte recente na família, da leitura do livro "Não me abandone jamais" (indicado pelo amigo Nick) ou dos exames que venho adiando para averiguar o nível de colesterol ruim. O fato é que o tema da morte voltou à baila esses dias.
A morte, a maledeta. Esse destino com temos tanta dificuldade de lidar. Que na verdade é a dificuldade de encarar a própria condição humana.
Nos últimos anos, o homem pode ter avançado sua compreensão de mundo de uma maneira nunca verificada, mas sobre o grande mistério fundamental, o sentido da vida, continuamos na mesma estaca zero de sempre.
Ainda que abramos mão de responder ao "De onde viemos?" e "Quem somos?", o "Para onde vamos?" restará como uma luz de alerta piscante lá no fundinho do subsconsciente. Da qual infelizmente, embora tentemos ignorar, não conseguiremos nos livrar.
Na verdade, fazemos mal uso da morte. Em vez de aceitá-la e usá-la como guia para uma vida mais plena, fazemos de conta que não tem a ver com a gente. Pelo menos por agora.
Mas a verdade é que somos tão mortais quanto o moribundo do hospital, o mendigo no relento ou o fuzileiro no Afeganistão. Só nos enchemos de distrações para esquecer que somos.
E quantas vezes tentamos nos agarrar a certezas que nos dêem ilusão de perenidade, como fortuna, fama, obras, relacionamentos.
Não que não precisemos escrever a história de nossas vidas.
Pelo contrário, a cada um cabe escrevê-la da melhor forma possível.
E aí reside o paradoxo, pois a consciência da morte é condição para uma vida mais plena.
É como viver com um olho no peixe e o outro no gato.
Sabendo que mais cedo ou mais tarde o gato irá atacar.
Então é melhor saborear cada mordida no peixe como se fosse a última.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Não pare pra pensar


Às vezes as pessoas riem de mim por me achar um completo "viajandão", principalmente quando estou perdido em meus devaneios e deixo transparecer isso.
Eu sei porque isso acontece e acho graça.
Sei que a todo momento estou trazendo à tona questionamentos nas quais as pessoas não estão interessadas ou não querem se interessar.
Mas de vez em quando encontro um ou outro disposto a compartilhar minhas dúvidas.
E aí percebo que na verdade, discutir dúvidas existencialistas é apenas uma escolha.
Mas essa escolha só pode ser feita por quem está preparado.
Por quem decidiu não se deixar encaixar a um modelo pré-concebido de existência, de felicidade, o que quer que seja.
Ou pelo menos se deixar ajustar a algum desses modelos de uma maneira consciente.
Porque livres, infelizmente, não somos.
É só pensar no seu porteiro. Você acha que ele tem escolha?
Os idealistas dirão que sim, mas eu duvido. E não por condição sócio-econômica. Mas porque o próprio nível de consciência do porteiro provavelmente não lhe permite.
Mas você, que é bem nascido e estudou, pode questionar?
Nem sempre.
Talvez por incapacidade ou preguiça.
Estão aí as patricinhas, os Big Brothers, os incautos, que não me deixam mentir.
A maioria de nós é presa fácil da lavagem cerebral dos mecanismos de controle de vida impostos.
Seja ele a religião, a família, o sistema capitalista ou as regras de inclusão do seu grupo social.
Esses mecanismos nos controlam desde que nos conhecemos por gente.
De modo que a possibilidade de "desmoldar" o já moldado é uma incógnita.
Será possível mudar nossa percepção de vida?
Seremos atores de outros "eus" que nem conhecemos?
Não sabemos.
E talvez façamos um esforço enorme para no final perceber que foi em vão.
Porque dizem que até os monges não atingem a iluminação.
Por isso talvez toda essa reflexão não valha a pena.
Por isso eu aconselho, se você ainda não começou, nem pense nisso.
É uma viagem sem volta e muito provavelmente sem destino.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Mania de explicação


Você conhece "Mania de explicação" da Adriana Falcão?
É um livro infantil "lindinho" sobre uma garota que tem explicações muito pessoais sobre as coisas da vida, usando metáforas poéticas inspiradíssimas para traduzir sua visão de mundo.
É um achado, uma grande sacada da autora, que torna o livro muito recomendável também para os adultos.
Bom, mas esse preâmbulo foi somente para falar do contrário, que são as explicações nada poéticas e totalmente dispensáveis do dia a dia.
Como por exemplo as justificativas do mundo corporativo.
Nesse mundinho já ficou institucionalizado que todo e qualquer assunto precisa de uma explicação que a justifique.
Se esse comportamento antes era restrito a áreas onde a formalidade impera, como no ramo da advocacia ou engenharia, hoje a mania de explicação está disseminada em todo tipo de negócio, mesmo aqueles onde a subjetividade deveria se sobrepor.
É o caso da minha área de atuação, a propaganda.
Na rotina atual de uma agência de propaganda, a divisão do tempo empregado está mais ou menos assim: 5% para a criação de idéias e 95% para justificativas e reavaliações.
Se de um lado pouca energia é empregada em inovação, gastamos uma Itaipu diária em encontrar explicações tangíveis para sustentar a mínima idéia junto ao cliente.
O que reflete a incapacidade das pessoas de tomarem decisões sem atribuir a outrem a responsabilidade por elas.
O bom e velho feeling, que nos tempos românticos eram bons guias para tomadas de decisões, hoje foram substituídos pelos achismos cientificamente provados dos institutos de pesquisa.
O que não significa que deixemos à mercê deles a decisão final. As pesquisas servem para apoiar preferências, mas nunca para desdizê-las. Nesse caso é melhor pesquisar de novo, pois "algo deve ter saído errado".
Fico imaginando se essa moda ultrapassar os portões corporativos e se inserir no comportamento social de maneira generalizada.
Simples propostas como um convite para ir ao teatro ou ao cinema exigirão a montagem de Power Points apontando as vantagens e desvantagens de cada uma para o convidado.
Nenhum filho torcerá mais por um time influenciado por um pai ou um tio mais fanático. Daqui para frente os garotinhos serão submetidos a análises profundas sobre as razões para torcer para essa ou aquela agremiação.
Se apaixonar então, será ainda mais complicado. Somente após uma análise fria envolvendo variáveis como personalidade, histórico, pontos em comum e outras particularidades do casal é que se poderá avaliar a potencialidade de uma união amorosa.Até para juntar os trapinhos sem oficialização será melhor que os casais contratem um consultor, ainda que de segunda linha.
O risco é que o mundo se transforme numa imensa Alemanha ou Japão, com regras cada vez mais rígidas suplantando a espontaneidade, a criatividade, o improviso.
Um mundo mais orquestra sinfônica e menos jam sessions.
Nada contra música clássica, mas hoje, mais do que nunca, estamos de saco cheio da previsibilidade das partituras.