terça-feira, 27 de outubro de 2009

Quem precisa de dinheiro?

As pessoas mentem, brigam, traem, se prostituem, enlouquecem, adoecem, estressam, matam e se matam por ele.
O dinheiro, maldito dinheiro.
Dizem que é só uma energia.
Que não deveria ficar parada, mas quem tem muito não cansa de acumulá-la.
Ter dinheiro faz toda a diferença no mundo capitalista.
Para o bem e para o mal.
Quem tem pouco vive em penúria.
Quem tem muito pode viver em sofreguidão.
Porque o dinheiro exige que se dê a ele o devido valor.
Que não é só o do seu poder de compra, mas principalmente o da sua significância.
Dinheiro dá poder, status, dependência.
Em vez de possuir o dinheiro, corremos o risco de ser possuído por ele.
Quantas vezes você não tomou decisões pelo medo de gastar, de deixar de ganhar, de perder, de ficar sem nenhum tostão?
Não é muito sofrimento para uma relação virtual com algo puramente ilusório?
Números num programa de computador?
Ok, não tenho a noção, por exemplo, de passar fome por falta de dinheiro.
Mas também não tenho noção de ter muito a ponto de poder esbanjá-lo, e nem por isso
acho que isso seja uma vantagem.
Para mim, a grande vantagem de ter muito dinheiro é poder aplicá-lo e com o rendimento, não depender mais de um salário.
Aí sim você se livra de uma vez dos seus dois patrões.
Do dinheiro e do seu empregador.
E, o melhor de tudo, passa a ser dono do seu tempo.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Desabafo

Não acho que meu blog deva ser um altar para expiar minhas frustrações, raivas e afins.
Prefiro reservá-lo a manifestações de criatividade, discussão de idéias, exposição de meu ponto de vista.
Mas hoje abro uma exceção para exprimir minha raiva, permitindo que meus dedos detonem o teclado ao seu bel prazer.
Estou triste porque tive que demolir meu projeto de reforma por não se enquadrar nas normas do meu condomínio.
E ainda tive um baita prejuízo material por conta da destruição.
Mas deixando de lado o prejuízo financeiro, me fere a alma ter que abrir mão das coisas que acalento.
Como foi o caso desse projeto de reforma, pensado e criado com o carinho que qualquer coisa que ponha no papel em branco merece.
Tudo que me cerca leva indelevelmente minha marca pessoal e me agride ter de abrir mão dessas coisas por incômodo da inveja alheia.
Sei que a vida pode nos reservar acasos muito piores do que entrar em prejuízo moral e financeiro.
E daí você precisa ter estômago para respirar fundo, fazer a necessária correção de rota e seguir adiante.
Mas, não sei se por perfeccionismo, talvez por uma peculiar teimosia que me acompanha desde criança, detesto ser contrariado.
Síndicos, burocratas, fiscais.
Fodam-se todos vocês.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

O peso que a balança não mede.


Uma das coisas que impedem alguém de ser feliz é ser uma pessoa pesada.
Não o pesado no sentido de quilinhos a mais, pois tem muito gordinho e gordinha por aí que passa com muita leveza pela vida.
Me refiro ao peso do astral, da energia, da aura que envolve o ser humano.
Uma pessoa pesada tem sempre uma nuvem cinzenta e carregada sobre a cabeça, e por consequência tende a nublar qualquer ambiente mais ensolarado que ela.
Não é difícil distinguir essa espécie de ave de mau agouro que mal chega ao lugar e já pesa nos ombros dos presentes.
Mas nem só de amargura se molda uma pessoa pesada.
Alguns parecem trazer essa característica do berço, pois nem todos passaram por percalços na vida que justifiquem a eterna expressão carrancuda.
E mesmo quem normalmente flana pela vida, também tem seus dias de toneladas a mais pelos ombros.
Normal, não há quem na vida não passe pelos altos sem penar pelos baixos.
E quando o nó se desata e o peso sai das costas, é um alívio tão grande que parecemos saídos de uma situação de convalescência.
Daí que não dá para entender quem não faz a opção pela diversão, pelo bom humor, pela espontaneidade pura e simples.
A gente tem mais é que rir de quem não ri de si mesmo.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Chocadeira


Ainda sobre o esporte amador no Brasil, pelo rápido crescimento da ginástica artística brasileira, é fácil constatar que onde há investimento sério os resultados inevitavelmente aparecem.
A combinação de ídolos com investimento constante em qualquer modalidade esportiva é suficiente para que surjam novos talentos e se crie enfim, uma escola.
É isso que falta para o esporte amador brasileiro explodir e enfim conquistar o status de potência olímpica.
Talento e vontade temos de sobra. Tire todas essas crianças de rua e dê uma quadra, uma raquete, uma vara para saltar. É capaz da gente até esquecer que esse já foi um infeliz país que precisou de heróis.
Porque em qualquer atividade, não só no esporte, só se alcançam resultados em quantidade e constância depois de estabelecida uma escola, com vários ídolos para copiar e seguir.
Isso vale para os esportes, as profissões, as artes.
Todo mundo teve um ídolo, um mestre, um padrinho, que lhe ensinou o caminho das pedras e incentivou a buscar a excelência.
Em qualquer atividade ninguém, mesmo os gênios, é filho de chocadeira.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

P.Q.P.!

Acabo de ver em reportagem do SporTV que me deixou indignado.
Numa competição de remo no Rio, uma dupla de remadores de 15, 16 anos de idade, depois de alcançarem a segunda colocação numa competição de duplas, foi desclassificada, puta que o pariu, porque os garotos estavam com uniformes diferentes.
Hello? Hello? Isso aqui é Brasil, dirigentes. Não é a Alemanha, não.
Gente chata.

O casamento do meu melhor amigo

Ao rever um trecho da comédia dor-de-cotovelo "O casamento do meu melhor amigo", percebi que um erro crasso foi cometido pelo roteirista/diretor/produtor.
O melhor amigo da Julia Roberts na trama não era o noivo, e sim o amigo gay que foi consolá-la ao final do filme.
Não estou fazendo defesa da classe, mas só mesmo um amigo gay para ter a sensibilidade de, ao perceber que a amiga ia dar com os burros n‘água em sua tentativa de reconquista, abandona seus compromissos e aparece de surpresa, já no final da festa, para consolar a arrasada mocinha.
Bom, se isso não for consideração, não sei o que é.
Deve ser por isso que as mulheres gostam tanto de seus amigos gays.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Viajar sem sair de casa

A Manhattan de Woody Allen

Sexta eu cruzei com a Fernanda no Genésio e ela me relatou sua viagem recente a Turquia, no caso Istambul e Capadócia. Na Capadócia, ela me conta que fez um passeio de balão sobrevoando o futurista cenário natural de Guerra nas Estrelas. Que inveja, ainda chego lá.
Enquanto isso, vou viajando pelos meios mais baratos que existem: livros, filmes, programas gastronômicos e documentários NatGeo e Discovery.
Graças a esses recursos tenho conseguido conter minha ambição turística, a saudade de aeroporto que me atormenta de vez em sempre.
Na verdade não sei se filmes e livros, ao contrário de saciar, só aguçam ainda mais a vontade de conhecer paisagens, povos, aromas.
Talvez ler Dostoievski, Turguêniev, Tolstoi e conhecer a arte de Chagall e Kandinsky, além das pernas da Maria Sharapova, só aumenta o desejo de me teletransportar para as famosas estações de metrô de Moscou.
Björk me convida para a Islândia, onde dizem existir muito mais do que gelo e a maior concentração de bandas de rock por km2 - é a Brasília da Europa.
Estou carregando nas tintas nos filmes europeus e asiáticos, me vi em Istambul, Tóquio, Belgrado num intervalo de poucos dias.
Pensando melhor, os livros e filmes me livram da falência da ambição de conhecer o mundo inteiro sem ter recursos para tanto.
Obrigado, produtores e editores. Vocês vão continuar sendo os agentes de viagem mais em conta e democráticos para turistas menos abonados.

Hipocondria na mídia


Já reparou na avalanche de séries sangrentas nos canais de tv?
Pois é, não faltam opções de seriados policiais e hospitalares para vampirinhos de plantão.
Daí eu pergunto, por que tanta hipocondria?
Por que tanta gente interessada em mortes, doenças, desgraça, sofrimento?
Ora, o interesse pelo sangue alheio não vem de ontem. Estão aí os telejornais e os Datenas da vida, que há tantos anos baseiam suas pautas em saraivada de balas.
Talvez uma maior oferta de canais só tenha evidenciado o sucesso que o apelo da violência faça no mundo inteiro.
Em especial nos EUA, onde essas séries são produzidas, e cuja origem da mentalidade paranóica não data de 11 de setembro de 2001.
Não estou aqui fazendo a apologia da censura nem da programação que feche os olhos para a realidade das nossas ruas.
Não seria coerente com a acertada diretriz do cinema nacional, que insiste em abrir nossos olhos para o estado de falência social.
Só acho estranho que nós, habitantes de grandes metrópoles, depois de nos recolher do ambiente inóspito das ruas, encontremos refúgio nos C.S.I. da vida.
Será que precisamos testemunhar que o cotidiano poderia ser ainda mais violento?
Ou é uma vontade reprimida de esganar o chefe?
Ou ainda, uma descarga catártica indispensável para sermos pais e filhos mais amorosos em casa?
Sei lá.
A mim me parece, como diria a Lúcia, uma hipocondria coletiva.
E para hipocondria, infelizmente não há remédio nem terapia que chegue.

O turismo na América Latina

Pergunte a qualquer amigo razoavelmente viajado quantos países da América Latina ele conhece.
Provavelmente ele dirá Argentina, Uruguai, Peru e com sorte, Chile, México e Caribe.
Entenda-se Buenos Aires, Punta del Este, Machu Picchu, Santiago, Cancún, Aruba e Cuba.
Ok, conheço gente que já se aventurou na Patagônia, no Atacama, Lagos Andinos e outras atrações caribenhas menos badaladas.
Mas a atratividade do turismo latino por aqui é tão inócua quanto a do turismo nacional de pontos mais afastados, como Amazônia, Ilha de Marajó e Tocantins.
Será despreparo do turismo nacional e de seus primos pobres da América Latina?
Sem dúvida que é.
Houve um tempo em que apenas a cidade de Buenos Aires atraía mais turistas que todo o Brasil.
Absurdo para um país sem nossas belezas naturais? Se você considerar que o turista procura boa informação, estrutura e sobretudo segurança, nem um pouco.
Nossos hermanos estão - ou pelo menos estavam - mais preparados para tratar seus turistas com o carinho que eles merecem.
Por outro lado, nós ainda pecamos muito em estrutura, falta de segurança e de consciência do mercado potencial que o turismo representa.
Confiamos demais na atratividade de belezas como o Rio de Janeiro, a Amazônia, o Pantanal, os Lençóis Maranhenses.
Mas esquecemos que os europeus encontram boas e mais próximas opções nas Ilhas Gregas e nas Rivieras Francesa e Espanhola.
Já americanos e canandenses, têm no Caribe seu porto seguro há muito tempo.
Por isso, se o turismo por aqui, especificamente o sul-americano, quiser abocanhar a fatia que lhe cabe no cenário mundial, precisará melhorar muito.
Muito está sendo feito, por exemplo, no nordeste brasileiro, e não por acaso por investidores estrangeiros, que devem entender bem a cabeça do turista lá de fora.
A Copa do Mundo e as Olimpíadas serão oportunidades únicas para o país se firmar no setor turístico.
Pena que até lá pouca coisa deverá mudar em termos de transporte, violência e pessoal preparado para receber e tratar bem os turistas.
Deserto de Atacama, Chile

sábado, 10 de outubro de 2009

O que não se quer

Para mim tão importante quanto saber o que se quer é saber o que não se quer.
Teoricamente, saber o que não se quer é mais fácil, mas nem por isso mais fácil de implantar.
A vida nem sempre permite evitar o que não se quer, mas eu tento.
E tenho tentado cada vez mais, na medida em que o tempo passa e você vai perdendo a paciência.
Parece uma postura ranzinza, mas eu considero libertária.
Eu não quero mais tolerar coisas que acho errado.
E esse errado é muitas vezes só errado para mim.
Não quero trabalhar para e com quem não gosto.
Não quero conviver com quem não me entenda.
Não quero viajar só porque é feriado.
Não quero seguir tendências por pressão de ser considerado ultrapassado.
Não quero comer porque é hora de comer.
Não quero entrar em forma.
Não quero ser áspero porque se acredita que a aspereza resolve os assuntos.
Não quero ser mais ambicioso do que o suficiente pra mim.
Não quero ser sério além do necessário.
E muitos "não queros" que se não definem tudo o que quero, já apontam uma direção.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Vaidade profissional


Qual a profissão número um em matéria de vaidade?
Faço essa pergunta porque já convivo com uma fábrica de egos que é o mercado publicitário. Mas tenho suspeitas de que em outras áreas o festival de "pitis" de prima-donas também não fica muito atrás.
Os médicos, por exemplo. Anos e anos sendo tratados e reverenciados como "doutores" não faz bem a algumas cabecinhas fracas que logo acabam se achando senhores do destino da humanidade. Logo a sobriedade profissional inerente à profissão cede a um complexo de superioridade sem cura.
Não vamos considerar nessa análise atores, pop stars, políticos e jogadores de futebol. Esses são hors concour no quesito ego.
Mas os escritores, dizem por aí, sofrem de uma espécie de vaidade ainda pior, já que nem platéia suficiente têm. Alguém uma vez disse que a diferença entre o jornalismo e a literatura é que o jornalismo é ilegível e a literatura não é lida.
E quanto aos advogados, que posição devem ocupar no panteão da vaidade? Depende da localização geográfica. Nos EUA, onde a lei funciona além da conta, são deuses. Por aqui, fazem gambiarras.
Engenheiros, conheço um pouco. Morei com alguns numa república quando cheguei a São Paulo. Dependendo da grife da faculdade podem até nutrir uma soberba, que se acaba no primeiro emprego, quando encaram a realidade de serem pau pra toda obra.
Enfim, vaidade profissional me parece ilusão.
Como já disseram, pise na sua antes de sair de casa pra trabalhar.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Vinhos


Estou terminando um livro sobre vinhos.
O primeiro sobre o assunto que leio e provavelmente, o único.
Livro sobre vinhos em geral é uma sucessão de nomes, denominações de origem e classificações de qualidade que só podem ser gravados e fazem sentido para iniciados
no assunto.
Para mim, um leigo que acreditou que poderia destilar conhecimento já na próxima degustação da bebida, foi uma avalanche de informação técnica sem qualquer chance de retenção na memória, esteja eu ou não embriagado.
A leitura só serviu para concluir que, em se tratando de vinho, o melhor aprendizado vem mesmo da prática.
Talvez fazer um curso até ajude, mas pressinto que, como tudo na vida, escolher o melhor vinho vai continuar tendo que passar pelo indefectível critério do gosto pessoal.
Daí que concluo que foi tempo perdido mesmo essa leitura.
Bem-feito para o metido a besta aqui.

Quem mandou não estudar?

Uma piada batida e recorrente entre publicitários é dizer uns aos outros "Quem mandou não estudar"?
A gente costuma empregar essa frase em tom irônico toda vez que se vê numa situação típica da profissão, por exemplo, tendo que encarar um trabalho casca-grossa ou perder um feriado dentro da agência.
Dificuldade que hoje em dia nem é exclusividade nossa, já que o pessoal do jornalismo ou mercado financeiro batem nossos recordes de jornada estendida.
Mas a ironia maior é que justamente os publicitários são os que não podem parar de estudar, mesmo.
Publicitário tem que saber de tudo um muito, senão corre o risco de se tornar repetitivo. Se não abrir a cabeça, pode daqui a pouco estar fazendo trabalho inspirado na própria rotina chata ou na vida do colega ao lado.
E como a mídia digital é uma realidade que chegou que nem rolo compressor, ai de quem ignorar as novas ferramentas.
Então a frase atualizada com que se deve censurar publicitários é "Quem mandou não estudar antes?".
Porque agora você, publicitário, vai ter que estudar e muito.

terça-feira, 6 de outubro de 2009

Os bem-sucedidos desocupados

Já disseram que quem trabalha demais não tem tempo de ganhar dinheiro.
Isso faz sentido se no caso, ganhar dinheiro se refere a estudar e fazer investimentos com seu salário, para multiplicá-lo.
Mas esse ditado também se aplica a quem, de tanto ficar de bobeira, acabou vendo oportunidades que quem não tira os olhos do computador não consegue enxergar.
De fato, você acha que quem criou os sites de cotação de compras estava digitando memorandos? Provavelmente estava fazendo suas comprinhas no shopping desdenhando de quem não arrumava um tempinho para fazer o mesmo.
Não vou listar casos para comprovar minha suposição. Já é tarde, e um trabalhador como eu não tem muito tempo para ficar enchendo linguiça em blog para provar teorias por A mais B.
Mas se tempo livre não fizesse bem ao progresso material de um povo, então quem estaria trabalhando, virando noites e finais de semana seriam ingleses, franceses, alemães. Povos que como se sabe derrubam o lápis as 18h em ponto, quando não antes.
Alguns vão dizer que eles já passaram por nosso estágio de nação e hoje desfrutam da riqueza acumulada.
Eu acho que nós, como nação nova e de espírito adolescente, ainda cometemos exageros próprios da juventude, nos atropelando o tempo todo ao correr atrás do próprio rabo em busca de sucesso, dinheiro, progresso a qualquer custo.
Pois se os nossos pais ainda dizem que a pressa é inimiga da perfeição, quem sou eu para contrariá-los, na minha humilde posição de atleta do dia-a-dia correndo contra o relógio?
Há algo de imperfeito no ar.

sábado, 3 de outubro de 2009

Diálogo entre o Médium e Monet

O Médium que recebia Monet, um dia teve um diálogo franco com o artista, que de corpo presente apareceu em seu quintal num domingo entediante:
- Sr Médium, desligue a tv. Tenho um assunto sério a tratar com você.
- Mas justo agora que o Parmera vai entrar em campo?
- Não acredito que você vai trocar um papo elevado sobre pintura comigo por um joguinho de futebol a toa...
- Mas é futebol-arte!
Monet arranca o controle da mão do Médium e desliga a tv a seu contragosto.
- Pôxa, mas que invasão. Como se não bastasse usar meu corpinho, agora você quer mandar no meu domingo?
- Vamos direto ao assunto. Não estou satisfeito com a repercussão do trabalho que você pinta incorporando o meu talento.
- Domingo a tarde não é hora de discutir a relação.
- Essa discussão não tem hora. Estou falando do assunto que para mim é o mais caro: meu trabalho, meu talento, meu tudo.
- Desculpa ser franco, mas não te ocorreu que o seu talento pode ter morrido junto com você?
- Como assim? O grande Monet é imortal. Como ousar duvidar do meu trabalho, exposto nos maiores museus do mundo?
- Aí é que está. Não estou duvidando do talento que, friso, em sua época foi revolucionário. Estou dizendo que talvez hoje, na era do efêmero, ele se foi.
- Quem se foi?
- O seu filho mais amado, seu talento.
- Ora, como ousa...
- Estou falando com a propriedade de quem empresta inteiramente o corpinho ao seu bel prazer. Estão aí minhas mãos direita e esquerda que não me deixam mentir. Seu talento já era, Monet.
- Peraí, não se fala assim impunemente com um artista da minha envergadura.
- Acontece que hoje em dia, artista de envergadura é o Usain Bolt. Tirando os professores de história da arte, ninguém mais quer saber de impressionismo. Aliás, você está com o aluguel do meu corpo atrasado.
- Eu estou sem dinheiro no além. Culpa sua, que não consegue vender nenhum quadro.
- Culpa minha? Seus quadros é que não enganam mais ninguém. Nem na Benedito Calixto nem na feirinha do Masp.
- Quer saber? Vou me embora do seu corpo. Esse seu corpinho mal cuidado não é digno de alguém que fez história nas artes.
- Já vai tarde. Não aguento mais me detonar toda vez que preciso incorporar um artista decadente e bebum como você.
E assim Monet resolveu desocupar o corpo do Médium, e enfim seguiu para o além onde retomou sua carreira pintando paisagens. Que mesmo não seguindo as técnicas do impressionismo, ainda assim exibiam resultados parecidos, já que as paisagens do purgatório também são meio assim, indefiníveis.